História do dia



O Senhor Frutuoso Inventor


O senhor Frutuoso é um grande inventor. Entre máquinas e maquinetas da sua particular invenção tem em casa para cima de uma centena.


Juntem-lhe as máquinas e maquinetas que outros inventores, de diversos pontos do mundo, lhe enviam e imaginem como será a casa do senhor Frutuoso, com tantos maquinismos a trabalhar.

Uma barulheira que só ouvindo. Tlim, tcham, pung? Poc, poc, poc? Bié, bié, bié? Bong! Tuque, taque, tique, tuque? Tuque, taque, tique, tuque? A história podia ser toda assim, embora talvez fosse um pouco cansativa.

- Tudo preciosidades - costuma dizer-me o senhor Frutuoso, quando vou visitá-lo e ele me encaminha pelos salões e corredores da sua casa, cheios de vitrines e de prateleiras, carregadas de inventos.

- Repare-me neste prodígio que me mandaram pelo correio - diz-me o senhor Frutuoso, acabando de desembrulhar diante de mim uma enorme encomenda.

- É um bonito relógio de parede - digo eu.

O senhor Frutuoso indigna-se:

- Isto não é num relógio de parede. É um invento fantástico de um ilustre correspondente meu do Brasil, o doutor Janísio Bisnaga Filho, não sei se conhece?

Por sinal, não conheço, mas isso pouco importa.

- Explicou-me o meu amigo Janísio por carta que este relógio tem um mostrador e três ponteiros. Um para as horas, outro para os minutos e o terceiro sabe para quê?

- Naturalmente para os segundos.

- Nada disso. O terceiro é para anunciar o tempo - proclama, entusiasmado, o senhor Frutuoso.

Não se percebe onde está o espanto, porque, tanto quanto sei, todos os relógios anunciam o tempo.

- Não é esse tempo, mas o tempo que vai fazer - impacienta-se o sábio.

- Ah! Anuncia as horas com antecedência? - estranho eu.

- Refiro-me ao tempo atmosférico, o tempo meteorológico, entendeu? Este relógio, além de dar horas, informa-nos, com vinte e quatro horas de antecedência, sobre o tempo que vamos ter, no dia seguinte.

Finalmente, o senhor Frutuoso conseguia fazer-me entender. De facto, o relógio, tal como os barómetros, tinha à roda do mostrador várias indicações: chuva, aguaceiros, tempo variável, bom tempo, etc. Não tinha ?etc.", já se vê, mas percebe-se?

O senhor Frutuoso deu-lhe corda e o relógio começou a trabalhar num tic-tac certinho e cumpridor. Reparei que o terceiro ponteiro apontou para as palavras ?Tempo quente". Ainda bem.

No dia seguinte, fiado no invento do Doutor Jasmínio Bisnaga Filho, saí de casa à fresca. Pois apanhei uma chuvada e uma friagem que não queiram saber. ?Afinal o relógio também se engana", pensei e nunca mais quis saber do caso.

Só há dias, quando tive de telefonar ao senhor Frutuoso por outros assuntos, é que voltei a lembrar-me do caprichoso relógio de parede. Do lado de lá, o senhor Frutuoso atendeu-me, com a voz fanhosa das grandes constipações.

- Estou assim por causa do relógio - explicou. - Tenho-me guiado pelo conselhos dele e não calcula as chuvadas e resfriamentos que suportei, nestes últimos dias. Passa-se qualquer coisa no funcionamento do aparelho, que não entendo. Atchim!

O sábio a espirrar e uma ideia a trespassar-me a cabeça de lado a lado. Botei-a logo cá para fora:

- Se o relógio veio do Brasil, não estará ele regulado para outro clima diferente do nosso? - perguntei.

Fez-se silêncio do outro lado do fio. Depois, o senhor Frutuoso voltou à fala:

- Tem razão, tem toda a razão. O relógio diz que está bom tempo e tempo quente, mas é no Brasil, onde foi montado. Seja como for é um grande invento. Atchim!

E o senhor Frutuoso desligou apressadamente o telefone, para poder assoar-se mais à vontade.





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